STATUS: planejando o voo com o avião nas costas

Uma loucura nada utópica

Quando me foi incumbida a tarefa de fazer um artigo científico, logo me veio o questionamento do porquê as pessoas preferiam assistir coisas voltadas ao entretenimento.

Eu considerava como o oposto da busca pelo conhecimento mais “erudito”, a procura pela distração e não necessariamente o aumento de conhecimento. Era inconcebível termos e vivermos numa sociedade assim. No que elevaria o caráter? Talvez fosse um questionamento muito pessoal em que eu sentia na própria pele mas queria transformar em algo que seria provado cientificamente. E por mim ainda.

“Era muito mais interessante assistir programas de auditório do que absorver conteúdos relevantes de um vídeo documentário”, consistia meu pensamento acerca do público em geral. E a razão disso? Estávamos “emburrecendo”? Diversão acima do conhecimento?

Meu problema de pesquisa girava em torno da TV como meio de comunicação em massa mais utilizado pela população brasileira e também a mais “acessível”. Constatei que as transmissões mais assistidas são as telenovelas e os programas de auditório em um contexto em que Edgar Morin explica que essa cultura está fortemente ligada ao lazer tornando-se um estilo de vida.

Agora, não estamos fazendo isso cada vez mais? Não digo e muito menos restrinjo aos programas televisivos mas incluo nesse pensamento a vida cotidiana. Sobrevivemos, isso é um fato. Mas nossa sobrevivência mental vem como uma balança. Pense comigo.

Um estudante universitário estuda durante o período noturno de uma determinada faculdade e durante o dia trabalha exercendo uma determinada função com o objetivo de financiar seus estudos. Não lhe sobra muito tempo livre, não é mesmo? Chega o final de semana ou então em um fina de período e ele só quer descansar a mente com algo simples mas divertido. Ele escolhe assistir algo, jogar algo, “zappear” canais ou vegetar em redes sociais, jogar uma “pelada” com os amigos, ir ao shopping andar um pouco… Muitas opções de lazer.

Note que ele não foi fazer uma pesquisa acadêmica, ou ler um livro, ou assistir a um debate, ou organizar sua rotina no papel, ou planejar algo “grandioso”. Claro que isso depende muito dos gostos pessoais, mas, no geral, chega um momento em que a mente só quer desligar algumas funções e lhe incentiva a dar um jeito de procurar tempo para ela simplesmente ser usada “em modo econômico”.

Porque ela se desgasta em excesso e chega um momento em que “atividades em modo automático” se tornam sua piscina em um mar revolto. Os vários “nadas” que às vezes escolhemos devido à exaustão. Agora, quem quer culpar o entretenimento?

O fato é que não aguentamos mais ter que dar a vida por direitos básicos. Morrer de trabalhar para desfrutar deste trabalho em somente algumas horas. Tantas burocracias para “conseguirmos” coisas das quais são essenciais à vida. Passamos para um ponto em que tivemos que simular uma fervorosa adoração pela nossa profissão só para que ela tornasse mais leve de lidar. Já não bastassem os trabalhados que não englobam o emprego ou o status.

Aquelas atividades que sempre foram essenciais e agora parecem “mais uma coisa” para se preocupar. Lavar uma louça, preparar o alimento, varrer a garagem, ajeitar um armário, cuidar e educar os filhos… Se tornaram um plus desgastante quando, na verdade, são manutenção constante para uma vida no mínimo agradável.

Aí decidimos balancear. Imaginar uma realidade diferente da nossa. Entrar em um mundo fantasioso para, por um segundo, pelo menos, não pensarmos na situação de nossa sobrevivência. Iremos condenar toda a forma de entretenimento? Acho que não, não é mesmo?

“Você acha que a novela/série/filme/livro/esporte que consumo e pratico são coisas ruins? Você está equivocada, querida autora!”

Não. Não é isso. Não é essa discussão comum do que é certo e errado fazer. Se trata de um avião que estamos carregando nas costas imaginando que um dia estaremos dentro dele voando para um lugar melhor. Estão nos fazendo carregar um avião sem combustível com a promessa de que voaremos nele. Enquanto isso, estamos projetando esse sonho em pequenas “visões” – ocultando-nos de ver um pouco da realidade cruel – em telas, páginas e etc…

Imaginar nos entretêm. Mas só o entreter-se  para não sentir a dor nas costas nunca nos fará mudar de posto.

De carregadores à pilotos.

Lamentavelmente.

 

 

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